Investimentos Verdes Estratégicos da China no Brasil: Uma Análise Aprofundada de Oportunidades, Impactos e Trajetórias Futuras Chineses ...
Investimentos Verdes Estratégicos da China no Brasil: Uma Análise Aprofundada de Oportunidades, Impactos e Trajetórias Futuras
Chineses no Brasil, com foco particular na crescente
"economia verde". A colaboração entre as duas nações tem se
aprofundado significativamente, com o total de investimentos chineses no Brasil
superando R400bilho~esdesde2007,eumaprojec\ca~odeR27 bilhões adicionais para
2025. Observa-se uma mudança estratégica no perfil desses investimentos, que se
deslocam de setores tradicionais de commodities para áreas de alto valor
agregado e sustentabilidade, como energias renováveis, veículos elétricos,
agricultura de baixo carbono e infraestrutura digital.
Essa reorientação é impulsionada tanto pelas ambiciosas
metas de sustentabilidade da China quanto pelas vantagens comparativas do
Brasil em recursos naturais e matriz energética limpa. Os benefícios para o
Brasil incluem a geração de empregos, a modernização industrial e a
transferência de tecnologia. No entanto, o relatório também identifica desafios
cruciais, como o risco de dependência excessiva, a necessidade de garantir a
distribuição equitativa dos benefícios e a mitigação de impactos
socioambientais. Recomendações estratégicas são apresentadas para que o Brasil
maximize as oportunidades dessa parceria, fortalecendo sua governança,
diversificando fontes de investimento e promovendo uma industrialização verde.
II. Introdução: A Parceria Verde Sino-Brasileira em
Evolução
A relação econômica entre Brasil e China tem se consolidado
como uma das mais dinâmicas e estratégicas no cenário global. Desde 2009, a
China se estabeleceu como o principal parceiro comercial do Brasil, um marco
que transcende o mero intercâmbio de bens e serviços para englobar um fluxo
crescente de investimentos e financiamentos. Essa parceria é ainda mais robusta
pela participação conjunta em plataformas multilaterais de grande relevância,
como o BRICS, o G20, a Organização Mundial do Comércio (OMC) e o BASIC (Brasil,
África do Sul, Índia e China), que proporcionam um terreno fértil para o
diálogo e a cooperação em questões econômicas e ambientais.
Em um contexto global de urgência climática, a
"economia verde" emergiu como um pilar central na agenda bilateral. A
crescente proeminência desse setor reflete um reconhecimento mútuo da
importância da sustentabilidade para o desenvolvimento a longo prazo de ambas
as nações. A China, com seus compromissos de atingir o pico de emissões de
carbono até 2030 e a neutralidade carbônica até 2060, tem se posicionado como
líder global em ação climática e tecnologia verde. Paralelamente, o Brasil tem
demonstrado um forte engajamento com a agenda ambiental internacional,
evidenciado por sua candidatura para sediar a COP30 em Belém em 2025. Essa
convergência de objetivos e compromissos cria um ambiente propício para a
expansão dos investimentos verdes.
O foco crescente na economia verde sinaliza uma evolução da
relação sino-brasileira, que transcende a tradicional dependência do comércio
de commodities. Historicamente, a pauta de exportações brasileira para a China
tem sido dominada por produtos primários, como soja, petróleo bruto e minério
de ferro. No entanto, a recente concentração de investimentos chineses em
setores como energias renováveis, veículos elétricos e agricultura sustentável
indica uma transição para uma parceria mais estratégica e de longo prazo. Essa
mudança envolve a transferência de tecnologia, a modernização industrial e a
busca por objetivos de sustentabilidade compartilhados. Este aprofundamento
pode levar a uma maior integração econômica e ao desenvolvimento mútuo, potencialmente
mitigando a vulnerabilidade histórica do Brasil às flutuações dos preços das
commodities e permitindo que o país ascenda na cadeia de valor em indústrias
sustentáveis.
Este relatório tem como objetivo fornecer uma análise
abrangente e baseada em dados dos investimentos chineses na economia verde do
Brasil. Serão exploradas a escala e os setores-chave desses investimentos, as
motivações estratégicas por trás deles, seus impactos multifacetados
(econômicos, sociais e ambientais), os marcos políticos que os facilitam e as
projeções futuras, desafios e recomendações estratégicas para ambas as nações.
III. Escala e Abrangência dos Investimentos Verdes
Chineses no Brasil
A. Visão Geral e Tendências de Investimento
O volume de investimentos chineses no Brasil tem demonstrado
uma trajetória de crescimento notável, solidificando a China como um dos
principais atores no cenário de investimento estrangeiro direto (IED) no país.
Desde 2007, os investimentos chineses totais no Brasil ultrapassaram a marca de
R400bilho~es.[1]EmtermosdeestoquedeIED,aChinaalcanc\couUS53.6 bilhões em 2023,
representando um aumento significativo de 44.3% em relação a 2022 e
posicionando o país como o 9º maior investidor no Brasil, conforme dados
oficiais do Banco Central do Brasil. O Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC)
estima que, entre 2007 e 2023, os investimentos chineses no Brasil totalizaram
US$73.3 bilhões, distribuídos em 264 projetos.
Uma tendência marcante observada nos últimos anos é a
crescente concentração desses investimentos em setores alinhados à economia
verde. Em 2023, por exemplo, US1.73bilha~o(aproximadamenteR9.7 bilhões) em
investimentos chineses foram registrados, com um notável direcionamento de 72%
desse montante para projetos de energia verde. Este percentual representa o
mais alto já registrado desde o início da série histórica do CEBC em 2007,
indicando uma clara e acelerada mudança estratégica em direção a investimentos
sustentáveis.
Para 2025, estão previstos R27bilho~es(aproximadamenteUS5.4
bilhões) em novos investimentos chineses no Brasil. Esses aportes foram
anunciados durante o Fórum Empresarial Brasil-China em Pequim, com a presença
do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Uma parcela substancial desses R
27bilho~esestaˊexplicitamentevinculadaainiciativasverdes,incluindouminvestimentodeUS1
bilhão pelo Envision Group para a produção de combustível de aviação
sustentável (SAF) e a criação de um centro de Pesquisa e Desenvolvimento
(P&D) em energia renovável.
A seguir, uma tabela consolidando as principais métricas de
investimento chinês no Brasil:
Métrica de Investimento |
Valor |
Período/Ano |
Fonte Principal |
Total de Investimentos Chineses |
> R$400 bilhões |
Desde 2007 |
|
Estoque de IED Chinês |
US$53.6 bilhões |
2023 |
|
Projetos Greenfield (Total) |
163 projetos, US$12.9 bilhões |
2015-2025 |
|
Investimentos CEBC Estimados |
US$73.3 bilhões |
2007-2023 |
|
Investimentos Chineses (com foco verde) |
US$1.73 bilhões (72% em energia verde) |
2023 |
|
Investimentos Projetados |
R$27 bilhões |
2025 |
|
B. Setores-Chave e Projetos de Destaque
Os investimentos chineses na economia verde do Brasil
abrangem uma variedade de setores estratégicos, com projetos emblemáticos que
demonstram a profundidade e a diversidade dessa colaboração.
Energias Renováveis e Transição Energética
O setor de energias renováveis é um dos principais destinos
do capital chinês. A empresa estatal chinesa CGN planeja investir mais
de R3bilho~es(US530 milhões) em um hub de energia renovável no Piauí. Este
complexo abrangerá geração eólica, solar, armazenamento de energia e energia
termosolar, com a expectativa de criar mais de 5.000 empregos durante a fase de
construção.
O Envision Group, líder global em tecnologia verde,
comprometeu-se com um investimento de até R5bilho~es(US1 bilhão) para construir
o primeiro Parque Industrial Net-Zero da América Latina no Brasil. Este parque
será dedicado à produção de Combustível Sustentável de Aviação (SAF),
hidrogênio verde e amônia verde, configurando um "ecossistema de óleo
verde". Complementando esses esforços, o
Windey Energy Technology Group e o Senai Cimatec
estão formando uma parceria para estabelecer um centro de Pesquisa e
Desenvolvimento (P&D) em energia renovável, com foco em soluções de energia
eólica e hidrogênio verde. A
Huawei também está explorando soluções tecnológicas
avançadas, como sistemas de armazenamento de energia em baterias (BESS),
carregadores ultrarrápidos para veículos elétricos e sistemas fotovoltaicos
inteligentes.
No âmbito financeiro, o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) e o China Development Bank (CDB)
assinaram um acordo de até US1.3bilha~o,dosquaisUS800 milhões serão destinados
a investimentos de longo prazo em infraestrutura, energia e desenvolvimento
verde.
Veículos Elétricos e Mobilidade Sustentável
O setor automotivo, com foco em veículos elétricos (EVs),
tem atraído investimentos substanciais. A GWM (Great Wall Motors)
anunciou um investimento de R$6 bilhões para expandir suas operações no Brasil,
com o objetivo de exportar veículos para toda a América do Sul e México. A
BYD já opera sete fábricas no Brasil, e seu complexo
em Camaçari, Bahia, está projetado para ser a maior planta da empresa fora da
Ásia. Em 2024, a BYD vendeu mais de 76.000 EVs no Brasil, representando 7 de
cada 10 carros elétricos comercializados no país. A
DiDi, proprietária do aplicativo 99 táxi, anunciou
investimentos em serviços de entrega e a construção de 10.000 pontos públicos
de recarga para promover a eletrificação de veículos.
Agricultura Sustentável e Bioeconomia
A cooperação na agricultura sustentável é formalizada por um
Memorando de Entendimento (2025-2030) assinado entre o Ministério do
Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar (MDA) do Brasil e o Ministério
da Agricultura e Assuntos Rurais (MARA) da China. Este acordo prevê R$27
bilhões para a modernização da agricultura familiar, incluindo importação de
máquinas agrícolas, implementação de energia renovável, plataformas digitais e
apoio técnico chinês. A
COFCO International, uma das maiores
comercializadoras de commodities da China, está envolvida na entrega de 1.5
milhão de toneladas de soja sustentável certificada do Brasil para a China,
demonstrando esforços em cadeias de suprimentos livres de desmatamento. Além
disso, a
REAG Capital Holding e a CITIC Construction
estão cooperando em um programa para converter pastagens degradadas em sistemas
de produção agrícola e florestal sustentável no Brasil.
Infraestrutura Digital e Tecnologias Inteligentes
A intersecção entre a economia verde e a digital é evidente
em vários projetos. A Dataprev e a Huawei estão desenvolvendo um
Centro Virtual de P&D em Inteligência Artificial (IA) para aplicações em
agricultura, saúde, segurança pública e mobilidade. O Ministério do
Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC) do Brasil e a Comissão
Nacional de Desenvolvimento e Reforma da China assinaram um Memorando de
Entendimento para fortalecer a cooperação em IA. O MDIC e o Ministério do
Comércio da China também assinaram uma carta de intenções para investimentos na
economia digital, abrangendo infraestrutura, serviços, digitalização, redes de
banda larga, centros de dados, computação em nuvem e cidades inteligentes. A
ByteDance, controladora do TikTok, pode investir em
um centro de dados de 300 megawatts no Porto de Pecém, Ceará, com acesso a
cabos submarinos e energia eólica renovável. A
ABES e o parque tecnológico chinês ZGC estão
fomentando parcerias em IA, infraestrutura de dados, expansão de mercados e
capacitação de talentos. O projeto "Rio AI City" visa transformar o
Parque Olímpico do Rio de Janeiro no maior hub de processamento de dados da
América Latina, com foco em energia limpa.
Minerais Críticos para a Transição Verde
O setor de minerais críticos também atrai investimentos
chineses, dada a importância desses recursos para as tecnologias verdes. O Baiyin
Nonferrous Group, um grupo minerador chinês, adquiriu a mina de cobre
Serrote em Alagoas com um investimento de R$2.4 bilhões. O Brasil possui
abundantes reservas de minerais críticos como terras raras, lítio, nióbio,
cobalto, cobre, grafite, urânio e tório, essenciais para a fabricação de
tecnologias de energia limpa e veículos elétricos. A China, por sua vez,
controla uma parcela substancial dos mercados globais de processamento de
minerais críticos, incluindo mais da metade da capacidade de refino de cobalto
e terras raras.
Tecnologia Ambiental e Restauração de Ecossistemas
A cooperação em tecnologia ambiental e restauração de
ecossistemas é um componente vital da parceria. O Ministério do Meio Ambiente e
Mudança do Clima (MMA) do Brasil e a Administração Nacional de Florestas e
Pastagens (NFGA) da China assinaram um memorando para fortalecer a cooperação
em restauração de vegetação e sumidouros de carbono. Este acordo inclui
transferência de tecnologia, intercâmbio de conhecimento, combate à
desertificação e promoção de alternativas sustentáveis para plásticos. O
projeto
CBERS (China-Brazil Earth Resource Satellite), uma
colaboração de longa data, é uma ferramenta essencial para o monitoramento
ambiental e resposta a desastres, rastreando as taxas de desmatamento na
Amazônia e fornecendo alertas em tempo real sobre desmatamento ilegal.
A seguir, uma tabela detalhando os principais projetos de
investimento verde chinês no Brasil:
Empresa Chinesa |
Setor(es) |
Valor do Investimento (R$/US$) |
Detalhes do Projeto |
GWM |
Veículos Elétricos |
R$6 bilhões |
Expansão de operações no Brasil para exportação para
América do Sul e México |
Meituan |
Delivery |
R$5 bilhões |
Atuação no mercado de entregas (app Keeta), 100 mil
empregos indiretos, 3-4 mil diretos |
CGN |
Energia Renovável |
> R3bilho~es(US530 milhões) |
Hub de energia renovável no Piauí (eólica, solar,
armazenamento, termosolar), 5.000+ empregos |
Envision Group |
Tecnologia Verde, SAF, H2 Verde |
Até R5bilho~es(US1 bilhão) |
1º Parque Industrial Net-Zero da América Latina (SAF, H2
verde, amônia verde) |
Mixue |
Alimentos e Bebidas |
R$3.2 bilhões |
Compra de produtos brasileiros, operação no Brasil, 25.000
empregos até 2030 |
Baiyin Nonferrous Group |
Mineração |
R$2.4 bilhões |
Aquisição da mina de cobre Serrote em Alagoas |
DiDi |
Mobilidade, Delivery |
Não especificado |
Investimentos em delivery e 10.000 pontos de recarga para
EVs |
Longsys |
Semicondutores |
R$650 milhões |
Aumento da capacidade produtiva em fábricas de SP e AM
|
BNDES & CDB |
Infraestrutura, Energia Verde |
US1.3bilha~o(US800M longo prazo) |
Financiamento de projetos de infraestrutura, energia e
desenvolvimento verde |
Dataprev & Huawei |
IA, Infraestrutura Digital |
Não especificado |
Centro Virtual de P&D em IA para agricultura, saúde,
segurança e mobilidade |
Windey & Senai Cimatec |
Energia Renovável (P&D) |
Não especificado |
Centro de P&D em energia renovável, foco em eólica e
hidrogênio verde |
COFCO International |
Agricultura Sustentável |
Não especificado |
Acordo para 1.5 milhão ton. de soja sustentável
certificada do Brasil para China |
A crescente participação de investimentos verdes,
especialmente em manufatura avançada (veículos elétricos), infraestrutura de
energia renovável e tecnologias digitais, representa uma mudança estratégica do
perfil de investimento chinês. Essa transformação se afasta da tradicional
concentração em extração de recursos para setores de maior valor agregado e
sustentabilidade. Essa evolução demonstra uma intenção deliberada da China de
investir em áreas que se alinham com as tendências globais de descarbonização e
com sua própria liderança tecnológica, em vez de se limitar à importação de
matérias-primas. Para o Brasil, essa dinâmica oferece uma oportunidade para
diversificar sua economia e promover a industrialização de seus setores verdes.
Essa mudança pode levar a uma parceria bilateral mais equilibrada e resiliente,
impulsionando cadeias de produção locais, transferência de tecnologia e a
criação de empregos qualificados no Brasil, superando a preocupação de
"reprimarização" da pauta de exportações.
Além disso, os investimentos chineses nos setores verdes do
Brasil não se destinam apenas ao mercado interno brasileiro, mas também
posicionam o Brasil como uma plataforma de exportação regional para produtos e
tecnologias verdes. A GWM, por exemplo, explicitamente declara que seu
investimento de R$6 bilhões visa a expansão "a partir de onde exportará
para toda a América do Sul e México". De forma similar, o Parque
Industrial Net-Zero do Envision Group, com foco em SAF, hidrogênio verde e
amônia verde, visa transformar o Brasil em um "centro de produção de óleo
verde" devido à sua abundância de biomassa e eletricidade renovável. Esses
exemplos sugerem que a China percebe o Brasil não apenas como um mercado
consumidor ou uma fonte de matérias-primas, mas como uma base estratégica de
produção para tecnologias e combustíveis verdes, aproveitando as vantagens
naturais únicas do Brasil e potencialmente atendendo a mercados mais amplos na
América Latina. Essa estratégia se alinha com a ambição do Brasil de se tornar
um exportador global de sustentabilidade e pode fortalecer seu papel nas
cadeias de suprimentos regionais, atraindo mais IED e promovendo a integração
econômica na América do Sul.
Por fim, uma parte substancial dos investimentos
"verdes" está intrinsecamente ligada à infraestrutura digital e à
inteligência artificial, o que indica uma abordagem holística para o
desenvolvimento sustentável. Os investimentos em IA (Dataprev & Huawei,
acordos do MDIC), centros de dados (potencial da ByteDance, Rio AI City) e plataformas
digitais para a agricultura não são isolados. Eles são enquadrados como
cruciais para acelerar a transição verde, por exemplo, utilizando a IA para a
agricultura sustentável, centros de dados alimentados por energias renováveis e
cidades inteligentes para eficiência energética. Essa interconexão demonstra
que a China vê a transformação digital como um facilitador chave para o
desenvolvimento verde. Essa abordagem integrada pode acelerar a transformação
digital do Brasil juntamente com sua transição verde, criando sinergias que
aumentam a eficiência, a inovação e a competitividade em múltiplos setores,
desde a agricultura inteligente até a gestão de energias renováveis.
IV. Impulsionadores Estratégicos dos Investimentos Verdes
da China no Brasil
A. Ambições de Sustentabilidade Global da China
As políticas de investimento externo da China são fortemente
influenciadas por suas ambiciosas metas domésticas de sustentabilidade. O
anúncio do Presidente Xi Jinping em 2020, que estabeleceu o compromisso de
atingir o pico de emissões de carbono até 2030 e a neutralidade carbônica até
2060, posiciona a China como um líder global na ação climática. Para alcançar
esses objetivos, o país tem investido massivamente em tecnologias limpas e
energias renováveis, tornando-se o maior produtor e instalador mundial de
energia solar e eólica, respondendo por cerca de 40% das adições globais de
capacidade em 2022. Essa liderança tecnológica é um ativo fundamental que a
China busca replicar e expandir em suas parcerias internacionais. A China
reconhece que o crescimento econômico sustentável e a proteção ambiental são
pilares essenciais para seu desenvolvimento a longo prazo, e seus investimentos
verdes no exterior são uma extensão dessa política doméstica.
B. Vantagens Comparativas do Brasil
O Brasil apresenta um conjunto de vantagens comparativas que
o tornam um destino altamente atraente para os investimentos verdes chineses.
Abundância de Recursos de Energia Renovável e Matriz
Energética Limpa
O Brasil possui uma das matrizes elétricas mais limpas do
G20, com vasto potencial hidrelétrico e recursos significativos de energia
solar e eólica. Essa abundância de fontes de energia limpa é um diferencial
para investidores que buscam descarbonizar suas operações e cadeias de suprimentos.
Vasto Potencial Agrícola e Oportunidades na Bioeconomia
O Brasil é um líder global na produção agrícola e oferece um
enorme potencial para o desenvolvimento de uma agricultura de baixo carbono e
da bioeconomia. O país tem capacidade para atender a toda a demanda adicional
por soja sem a necessidade de desmatar o Cerrado, graças à disponibilidade de
extensas áreas de pastagens aptas para a produção. Além disso, a liderança
brasileira no melhoramento genético de cultivares adaptados a ambientes
tropicais e subtropicais, juntamente com um ambiente regulatório consolidado
para Organismos Geneticamente Modificados (OGMs), cria oportunidades para
parcerias tecnológicas.
Ricas Reservas de Minerais Críticos Essenciais para
Tecnologias Verdes
O Brasil detém reservas significativas de minerais críticos,
como terras raras, lítio, nióbio, cobalto, cobre, grafite, urânio e tório.
Esses minerais são indispensáveis para a fabricação de tecnologias de energia
limpa, veículos elétricos e outras aplicações de alta tecnologia. A China, que
já controla uma parte substancial dos mercados globais de processamento de
minerais críticos, busca garantir o acesso a essas matérias-primas essenciais
para sua própria transição verde.
C. Alinhamento Geopolítico e Econômico
A convergência de interesses entre Brasil e China é também
impulsionada por fatores geopolíticos e econômicos.
Estratégia de "Powershoring" para Produção
Intensiva em Energia
O Brasil se posiciona como um parceiro importante na
estratégia chinesa de "powershoring", que envolve a realocação de
produção intensiva em energia para países com fontes abundantes e limpas,
visando a exportação. Essa estratégia permite à China descarbonizar parte de
sua produção industrial, ao mesmo tempo em que o Brasil atrai investimentos e
agrega valor à sua economia.
Fortalecimento da Cooperação Sul-Sul e dos Laços BRICS
A participação conjunta no BRICS facilita significativamente
as parcerias entre Brasil e China. A China vê o Brasil como um parceiro
estratégico de longo prazo, disposto a investir na formação de talentos e no
estabelecimento de cadeias de produção locais, não apenas como um destinatário
de investimentos pontuais.
Diversificação das Cadeias de Suprimentos em Meio a
Dinâmicas de Comércio Global
Em um ce
nário de rivalidades comerciais, especialmente com
os Estados Unidos, a China tem ampliado seus investimentos no Brasil como parte
de uma estratégia para diversificar suas parcerias globais e assegurar cadeias
de suprimentos para tecnologias e produtos verdes. Essa abordagem busca
alavancar a vasta capacidade tecnológica e financeira da China em escala
global.
Busca do Brasil por Parceiros Estratégicos
O Brasil, por sua vez, busca reanimar e modernizar seu setor
industrial com parceiros que respeitem seu ritmo e visão de desenvolvimento de
longo prazo. A abordagem pragmática da China, muitas vezes desprovida de
condições políticas ou fiscais explícitas, oferece ao Brasil maior autonomia na
definição de suas prioridades de desenvolvimento.
A convergência das necessidades econômicas e ambientais da
China com os imperativos de modernização econômica e preservação ambiental do
Brasil cria uma relação simbiótica poderosa. A China, com suas ambiciosas metas
de redução de carbono e liderança em tecnologia verde , busca recursos
sustentáveis e novos mercados para sua produção industrial verde. O Brasil, com
seus vastos recursos naturais e uma matriz energética limpa , necessita de
investimentos e tecnologia para desenvolver sua economia verde, gerar empregos
e cumprir seus próprios compromissos climáticos, como a restauração de 12
milhões de hectares de terras degradadas até 2030. Essa dinâmica configura um
cenário de benefício mútuo, onde as estratégias nacionais se alinham. Esse
alinhamento sugere uma parceria mais resiliente e menos transacional,
impulsionada por objetivos estratégicos de longo prazo compartilhados, o que
pode estabelecer um modelo para a cooperação Sul-Sul em desenvolvimento
sustentável.
A concepção de "powershoring" destaca uma estratégia
chinesa sofisticada que vai além da mera busca por matérias-primas, visando
alavancar a energia limpa do Brasil para a descarbonização de sua própria
indústria. O Brasil, com a "matriz elétrica mais verde do G20" e
abundância de água , oferece um ambiente ideal para que a China transfira
partes de sua produção intensiva em energia (como componentes de veículos
elétricos ou produtos químicos industriais). Essa movimentação permite à China
"deslocar" sua pegada de carbono, mantendo a eficiência produtiva,
enquanto o Brasil se beneficia da industrialização e da agregação de valor em
sua economia. Isso implica um nível mais profundo de integração industrial e a
possibilidade de o Brasil se tornar um ator central nas cadeias de valor verdes
globais, evoluindo de um simples fornecedor de matérias-primas para um produtor
de bens verdes intermediários e acabados. Tal desenvolvimento também pode
mitigar algumas das preocupações ambientais associadas aos métodos de produção
chineses.
V. Impactos Multifacetados na Economia Verde do Brasil
A. Desenvolvimento Econômico e Geração de Empregos
Os investimentos chineses têm um impacto significativo no
desenvolvimento econômico do Brasil e na geração de empregos. Os R27bilho~esprojetadospara2025,porexemplo,prometemacriac\ca~odeumnuˊmeroconsideraˊveldepostosdetrabalho.OinvestimentodeR5
bilhões da Meituan no setor de delivery, por exemplo, prevê a geração de
100.000 empregos indiretos e entre 3.000 e 4.000 empregos diretos em sua
central de atendimento no Nordeste. Da mesma forma, o aporte de R
3bilho~esdaCGNnohubdeenergiarenovaˊvelnoPiauıˊdeveraˊcriarmaisde5.000empregosnafasedeconstruc\ca~o.[14,20]AredeMixue,comuminvestimentodeR3.2
bilhões, projeta a criação de 25.000 empregos até 2030.
Esses investimentos em setores como veículos elétricos (GWM,
BYD) e semicondutores (Longsys) contribuem para a modernização da base
industrial brasileira e para o aumento do Produto Interno Bruto (PIB). O
sucesso da Zona Franca de Manaus, impulsionado em parte pela presença de
empresas chinesas de tecnologia como Gree e OPPO, ilustra como o capital chinês
pode dinamizar economias regionais e promover o desenvolvimento sustentável por
meio da inovação.
Embora as exportações brasileiras para a China ainda sejam
majoritariamente concentradas em commodities (soja, petróleo bruto e minério de
ferro representam 75.6% do total) , os novos investimentos verdes visam
diversificar a pauta exportadora e agregar valor. O Presidente Lula tem
enfatizado a importância de utilizar a receita do agronegócio para investir em
educação, a fim de que o Brasil possa competir em setores como veículos
elétricos, baterias e inteligência artificial. A ApexBrasil, inclusive,
identificou quase 400 oportunidades para expandir e diversificar as exportações
brasileiras para a China.
B. Avanço Tecnológico e Inovação
A parceria sino-brasileira na economia verde também
impulsiona o avanço tecnológico e a inovação no Brasil. Acordos recentes
preveem a criação de um Centro de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) em
energia renovável, uma colaboração entre o Windey Energy Technology Group e o
Senai Cimatec. Um Centro Virtual de P&D em Inteligência Artificial, fruto
da parceria entre Dataprev e Huawei, também está em planejamento. Além disso, o
Memorando de Entendimento entre o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação
(MCTI) do Brasil e o Ministério da Ciência e Tecnologia da China visa
estabelecer um Centro de Transferência de Tecnologia.
Os investimentos na fabricação de veículos elétricos (GWM,
BYD) e na produção de semicondutores (Longsys) indicam um movimento em direção
à localização da produção. Esse processo fomenta o desenvolvimento de cadeias
de suprimentos domésticas e reduz a dependência de importações. Na agricultura,
a cooperação inclui a promoção de
joint ventures para a fabricação nacional de insumos
e a disponibilização de espaços para testes e produção local de equipamentos,
fortalecendo a base tecnológica do setor agrícola.
C. Implicações Ambientais e Sociais
Os investimentos chineses na economia verde do Brasil
apresentam implicações ambientais e sociais complexas, com benefícios e
desafios inerentes.
Suporte às Metas Climáticas do Brasil
A cooperação bilateral tem um papel crucial no apoio às
metas climáticas do Brasil. O Memorando de Entendimento entre o Ministério do
Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) do Brasil e a Administração Nacional de
Florestas e Pastagens (NFGA) da China foca na restauração da vegetação e na
criação de sumidouros de carbono. Ambos os países compartilharão suas
experiências em programas de reflorestamento em larga escala, como a
"Grande Muralha Verde" da China e os sistemas agroflorestais do
Brasil. Essa iniciativa é fundamental para o compromisso do Brasil de restaurar
12 milhões de hectares de terras degradadas até 2030.
Adicionalmente, o projeto de satélites CBERS, uma
colaboração de longa data entre Brasil e China, é uma ferramenta vital para o
monitoramento do desmatamento na Amazônia, fornecendo alertas em tempo real
sobre atividades ilegais. Iniciativas como a cadeia de suprimentos de soja
livre de desmatamento da COFCO buscam alinhar a cooperação econômica com a
sustentabilidade ambiental.
Desafios Relacionados à Pegada Ambiental de Componentes
Importados
Apesar dos avanços na matriz energética limpa do Brasil, a dependência
da importação de componentes para tecnologias verdes, como o silício para
painéis solares, da China, que possui uma matriz elétrica 17 vezes mais
poluente, gerou 4 milhões de toneladas de emissões de CO2 em 2024. Isso revela
um custo ambiental "oculto" na transição verde, onde a
"verdor" do produto final no Brasil é compensada pela intensidade de
carbono de sua fabricação na origem. Essa situação aponta para a necessidade de
o Brasil buscar a localização de mais etapas da cadeia de suprimentos de
tecnologia verde, como a produção de silício, para concretizar plenamente suas
ambições de baixo carbono e capturar maior valor agregado, ao mesmo tempo em
que reduz essa "pegada de carbono importada".
Abordagem de Potenciais Conflitos Sociais e Ambientais
Investimentos chineses históricos na América Latina,
especialmente em recursos naturais, foram associados a um aumento no uso da
água, maiores emissões de GEE e potenciais conflitos sociais, à medida que
projetos competem por recursos com comunidades locais. Projetos de
infraestrutura, incluindo aqueles potencialmente vinculados à Iniciativa do
Cinturão e Rota, podem levar ao desmatamento se não forem gerenciados com
rigor. A concentração em exportações de commodities para a China historicamente
gerou menos empregos por dólar em comparação com outras exportações, levantando
preocupações sobre os benefícios de emprego para as comunidades locais.
Especialistas alertam para o risco de o Brasil se tornar excessivamente
dependente dos recursos chineses, especialmente em um cenário global instável.
A busca por crescimento econômico através do investimento
estrangeiro, mesmo em setores "verdes", pode gerar pressão sobre os
recursos naturais e as comunidades locais se não for acompanhada por uma
supervisão regulatória robusta e engajamento das partes interessadas. O exemplo
da Chinalco no Peru demonstra que empresas chinesas podem aderir a altos
padrões quando os governos os priorizam. Isso sublinha a importância de o
Brasil implementar e fazer cumprir proativamente salvaguardas ambientais e
sociais rigorosas, garantindo que os investimentos contribuam para um
desenvolvimento inclusivo e sustentável, em vez de agravar desigualdades
existentes ou a degradação ambiental. Isso exige uma forte liderança governamental
e a participação comunitária no planejamento e execução dos projetos.
A seguir, uma avaliação dos impactos ambientais e sociais
por setor:
Setor |
Benefícios Ambientais Chave |
Desafios/Riscos Ambientais Chave |
Benefícios Sociais Chave |
Desafios/Riscos Sociais Chave |
Energia Renovável |
Redução de CO2, matriz energética limpa |
CO2 de componentes importados (ex: silício chinês) |
Geração de empregos (5.000+ na construção) , transferência
de tecnologia |
Dependência tecnológica , impactos locais de projetos (ex:
uso da terra) |
Veículos Elétricos |
Zero emissão de poluentes |
Descarte de baterias, mineração de lítio/cobalto |
Geração de empregos na manufatura , modernização
industrial |
Potencial impacto na indústria automotiva tradicional,
dependência de importação de componentes |
Agricultura Sustentável |
Redução de desmatamento (soja DCF) , sequestro de carbono
(agroflorestais) |
Uso da água , desmatamento por expansão agrícola |
Modernização da agricultura familiar , segurança alimentar
|
Impacto na geração de empregos locais , conflitos por
terra e recursos |
Infraestrutura Digital |
Eficiência energética (data centers verdes) |
Consumo de energia, resíduos eletrônicos |
Geração de empregos em TI , desenvolvimento de IA ,
conectividade |
Exclusão digital, privacidade de dados |
Minerais Críticos |
Essenciais para tecnologias verdes |
Impacto ambiental da mineração (água, solo,
biodiversidade) , emissões de processamento |
Geração de empregos na mineração |
Conflitos com comunidades locais, impactos na saúde,
questões de governança |
Restauração de Ecossistemas |
Aumento de sumidouros de carbono , conservação da
biodiversidade |
Desafios de implementação em larga escala |
Apoio a meios de subsistência locais e indígenas |
Não especificado |
VI. Marcos Políticos e Mecanismos de Cooperação Bilateral
A. Iniciativas do Governo Brasileiro
O governo brasileiro tem implementado uma série de
iniciativas para atrair e facilitar investimentos verdes, alinhando-se à sua
agenda de transformação ecológica.
O programa "Eco Invest Brasil", parte do
Plano de Transformação Ecológica do Brasil, foi lançado com o objetivo de
impulsionar investimentos estrangeiros em projetos sustentáveis. Ele oferece
instrumentos de proteção cambial e linhas de crédito competitivas para mitigar
os riscos da volatilidade do câmbio, tornando os investimentos verdes mais
atrativos e seguros. O desenvolvimento de instrumentos financeiros, como a
proteção cambial e as taxonomias sustentáveis, é crucial para reduzir os riscos
e atrair capital verde chinês e de outras fontes estrangeiras. A necessidade do
Brasil por capital estrangeiro para sua transição verde é evidente, mas o país
enfrenta desafios como a volatilidade da taxa de câmbio e os altos custos de
financiamento. O programa "Eco Invest Brasil" e a adoção pela CVM dos
padrões ISSB, juntamente com o desenvolvimento de uma taxonomia sustentável ,
são respostas diretas a esses obstáculos. Essas iniciativas políticas visam
criar um ambiente de investimento mais previsível e transparente para projetos
verdes. Ao mitigar os riscos cambiais e fornecer definições claras para
investimentos "verdes", o Brasil está ativamente removendo barreiras
para investidores estrangeiros, que buscam cada vez mais oportunidades
alinhadas a critérios ESG. Isso posiciona o Brasil não apenas como um receptor
passivo de investimentos, mas como um ator proativo na moldagem de seu cenário
financeiro para se alinhar às tendências globais de finanças sustentáveis,
buscando ser um líder em finanças verdes no Sul Global. Essa postura ativa é
fundamental para atrair os "trilhões" necessários para uma transição
justa.
O Brasil também está trabalhando para simplificar seu
ambiente de negócios e aumentar sua competitividade para investidores
estrangeiros, por meio de iniciativas como a Janela Única de Investimentos.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) do Brasil se tornou
o primeiro regulador do mercado de capitais no mundo a adotar oficialmente o
padrão internacional de reporte de sustentabilidade do ISSB (International
Sustainability Standards Board). Essa medida visa destravar o capital privado
por meio de maior transparência e comparabilidade entre as empresas. A CVM
também está desenvolvendo uma taxonomia sustentável brasileira para classificar
atividades econômicas com base em critérios ESG, com um "selo verde"
a ser implementado antes da COP30.
B. Principais Acordos e Diálogos Bilaterais
A cooperação sino-brasileira é sustentada por uma série de
acordos e diálogos de alto nível.
O Fórum Empresarial Brasil-China e as visitas de alto
nível, como a do Presidente Lula à China em maio de 2025, são plataformas
cruciais para o anúncio de novos investimentos e o fortalecimento dos laços
bilaterais.
Memorandos de Entendimento (MoUs) sobre cooperação
financeira são fundamentais. O People's Bank of China (PBOC) e o Banco
Central do Brasil (BCB) assinaram um MoU sobre Cooperação Financeira
Estratégica e renovaram um acordo de swap de moeda local de RMB190
bilhões/BRL157 bilhões. O objetivo é melhorar o ambiente de investimento do
mercado financeiro, promover a cooperação monetária e facilitar pagamentos transfronteiriços.
O
BNDES e o China Development Bank (CDB)
assinaram um acordo de até US1.3bilha~o,comamaiorpartedestinadaainvestimentosdelongoprazoeminfraestrutura,energiaedesenvolvimentoverde.[26]Aleˊmdisso,oBNDESeo∗∗Export−ImportBankofChina(CEXIM)∗∗assinaramumMoUparaexplorarumfundodeinvestimentoconjuntodeateˊUS1
bilhão.
Acordos em áreas-chave da economia verde também são
numerosos. O Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA) do
Brasil e a Administração Nacional de Florestas e Pastagens (NFGA) da
China assinaram um memorando para fortalecer a cooperação em restauração de
vegetação e sumidouros de carbono, incluindo transferência de tecnologia e
intercâmbio de conhecimento. O
Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e
Serviços (MDIC) do Brasil e a Comissão Nacional de Desenvolvimento e
Reforma/Ministério do Comércio da China assinaram MoUs para fortalecer a
cooperação em IA e investimentos na economia digital, incluindo infraestrutura
verde e de baixo carbono. Por fim, o
Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura
Familiar (MDA) do Brasil e o Ministério da Agricultura e Assuntos Rurais
(MARA) da China assinaram um MoU (2025-2030) para cooperação em mecanização
e tecnificação da agricultura familiar.
A vasta quantidade e a amplitude temática dos acordos
bilaterais demonstram uma estratégia deliberada e multifacetada para aprofundar
a cooperação em diversos subsetores da economia verde. Isso não se limita a
projetos individuais, mas busca construir uma estrutura institucional robusta
para a colaboração de longo prazo, envolvendo múltiplos ministérios
governamentais e entidades estatais (como BNDES, PBOC, MMA, MDIC). Essa
abordagem indica uma intenção estratégica de integrar políticas e facilitar uma
ampla gama de iniciativas verdes. Tal estrutura abrangente sugere um alto grau
de compromisso de ambos os governos em fomentar uma "comunidade com futuro
compartilhado" no desenvolvimento sustentável. Ela fornece o arcabouço
legal e político necessário para que os investimentos do setor privado e a
transferência de tecnologia prosperem, tornando a parceria mais resiliente a
flutuações de curto prazo ou pressões externas.
C. Plataformas Multilaterais
Brasil e China utilizam plataformas multilaterais como
BRICS, G20 e BASIC para discutir e avançar agendas comuns sobre mudanças
climáticas, finanças verdes e desenvolvimento sustentável. O "Diálogo
Brasil-China sobre Agricultura Sustentável" é um exemplo de iniciativa
conjunta nesse contexto, que visa canalizar capital chinês para projetos de
agronegócio de baixo carbono no Brasil.
VII. Perspectivas Futuras, Desafios e Recomendações
Estratégicas
A. Projeções para o Crescimento do Investimento a Longo
Prazo
A visão de longo prazo do Brasil, centrada na expansão da
energia renovável e da infraestrutura digital, o torna cada vez mais atraente
para a China, um parceiro do BRICS. O planejamento estratégico visa posicionar
o Brasil como um ator estratégico de longo prazo, e não apenas como um receptor
de investimentos pontuais.
Espera-se um crescimento contínuo em setores-chave como
energia renovável (solar, eólica, armazenamento de energia, hidrogênio verde),
veículos elétricos (manufatura e infraestrutura de carregamento), agricultura
sustentável (práticas de baixo carbono, bioeconomia) e infraestrutura digital
(centros de dados, IA).
A próxima presidência do G20 pelo Brasil e o acolhimento da
COP30 em Belém em 2025 oferecem uma plataforma significativa para atrair mais
investimentos verdes e consolidar o papel do país como líder global em soluções
climáticas. O Brasil pretende alavancar sua matriz energética limpa e seu
agronegócio eficiente para se tornar um grande exportador de sustentabilidade.
B. Principais Desafios e Riscos
Apesar das oportunidades, a parceria com a China na economia
verde apresenta desafios e riscos que precisam ser gerenciados.
Especialistas alertam para o risco de o Brasil se tornar
excessivamente dependente do capital e da tecnologia chineses, especialmente em
um cenário global instável, onde decisões políticas e econômicas internacionais
podem impactar diretamente o país. A volatilidade no mercado financeiro chinês,
por exemplo, pode afetar os preços das commodities e as receitas de exportação
do Brasil.
A garantia de uma distribuição equitativa dos benefícios e a
mitigação de impactos sociais e ambientais negativos são cruciais. Embora
empresas chinesas tenham demonstrado disposição para cumprir padrões ambientais
quando estes são priorizados pelos governos anfitriões , investimentos
históricos na América Latina foram associados a um aumento no uso da água,
maiores emissões de GEE e potenciais conflitos sociais. Projetos de
infraestrutura, incluindo aqueles potencialmente sob a Iniciativa do Cinturão e
Rota, podem levar ao desmatamento se não forem cuidadosamente gerenciados. O
desafio reside em garantir que os benefícios econômicos se traduzam em
bem-estar social amplo e não agravem as desigualdades existentes.
A navegação em meio às mudanças geopolíticas e tensões
comerciais globais é outro desafio. A rivalidade comercial entre os EUA e a
China pode forçar o Brasil a fazer escolhas estratégicas difíceis, impactando
as relações comerciais e os fluxos de investimento. A capacidade do Brasil de
manter uma postura "ideologicamente neutra" pode ser testada.
A "pegada de carbono importada" representa um
desafio para as metas de descarbonização do Brasil. A dependência da importação
de componentes (como o silício solar) de países com matrizes energéticas menos
limpas é um custo ambiental que precisa ser abordado.
Por fim, restrições fiscais e de governança em países em
desenvolvimento como o Brasil podem dificultar a escalabilidade de projetos de
infraestrutura sustentável.
Os investimentos verdes da China no Brasil, além de seu
valor econômico, também funcionam como uma ferramenta estratégica para ampliar
a influência geopolítica chinesa e posicioná-la como um ator global
responsável, especialmente no Sul Global, em meio à concorrência com os Estados
Unidos. A China, ao investir em tecnologias verdes e desenvolvimento
sustentável, se apresenta como um parceiro para um crescimento de longo prazo e
mutuamente benéfico, em contraste com possíveis críticas ou condicionalidades
ocidentais. Isso gera boa vontade e fortalece seus laços com economias emergentes
importantes como o Brasil, particularmente no âmbito do BRICS. O Brasil pode
aproveitar essa competição geopolítica diversificando suas parcerias e
negociando termos favoráveis que priorizem seus objetivos de desenvolvimento
nacional, incluindo a transferência de tecnologia e o conteúdo local. No
entanto, o Brasil deve também estar atento aos riscos de uma potencial
"diplomacia da armadilha da dívida" ou de uma dependência excessiva,
que poderiam limitar sua autonomia política futura.
C. Recomendações Estratégicas para o Brasil
Para que o Brasil maximize os benefícios da parceria com a
China e mitigue os riscos, as seguintes recomendações estratégicas são
pertinentes:
- Diversificar
Fontes de Investimento Estrangeiro e Fomentar a Indústria Verde Doméstica:
Buscar ativamente investimentos de uma gama mais ampla de parceiros
internacionais para reduzir a dependência excessiva de um único país.
Concomitantemente, implementar políticas que incentivem a inovação
doméstica e o crescimento de indústrias verdes locais para construir
capacidade interna e cadeias de valor, especialmente em áreas como a
produção de silício solar.
- Fortalecer
Marcos Regulatórios e Governança Ambiental: Implementar e fiscalizar
rigorosamente avaliações de impacto ambiental e social para todos os
projetos de grande escala, independentemente da origem do investidor.
Assegurar transparência e responsabilidade ao longo de todo o ciclo de
vida dos projetos. Utilizar marcos existentes, como a Política Nacional de
Resíduos Sólidos (PNRS) para indústrias químicas.
- Priorizar
a Absorção de Tecnologia e o Desenvolvimento de Conteúdo Local:
Negociar acordos de investimento que incluam cláusulas explícitas para
transferência de tecnologia, colaboração em P&D e requisitos de
conteúdo local. Isso facilitará a absorção de tecnologias verdes avançadas
e a formação de uma força de trabalho local qualificada.
- Promover
Padrões de Finanças Verdes e Mecanismos de Financiamento Inovadores:
Continuar a desenvolver e implementar taxonomias sustentáveis e
instrumentos financeiros (como o Eco Invest Brasil e títulos verdes) para
atrair e canalizar capital de forma eficiente para projetos genuinamente
verdes, garantindo o alinhamento com as melhores práticas internacionais.
- Aprimorar
a Transparência e o Engajamento das Partes Interessadas no Desenvolvimento
de Projetos: Fomentar um diálogo inclusivo com comunidades locais,
populações indígenas e organizações da sociedade civil em todas as fases
de planejamento e implementação de projetos, a fim de mitigar conflitos
sociais e assegurar a distribuição equitativa dos benefícios.
- Alavancar
Plataformas Multilaterais: Manter um engajamento ativo em fóruns como
BRICS, G20 e outras plataformas multilaterais para defender uma agenda
verde global que apoie a transição de países em desenvolvimento, incluindo
financiamento climático justo e acesso à tecnologia.
Para o Brasil, os investimentos verdes chineses representam
uma oportunidade crucial para alcançar uma "industrialização verde"
que vá além da exportação de commodities e aborde seus desafios históricos de
desenvolvimento. A pauta de exportações brasileira, historicamente concentrada
em commodities , pode ser transformada. O Presidente Lula tem enfatizado a
importância de utilizar a receita do agronegócio para investir em educação, a
fim de que o Brasil possa competir em setores como veículos elétricos, baterias
e inteligência artificial. Os investimentos atuais em manufatura de veículos
elétricos, SAF, hidrogênio verde e agricultura avançada indicam um caminho para
que o Brasil rompa o ciclo de "reprimarização" ao desenvolver
capacidade industrial doméstica em setores verdes de alto valor. Isso não se
trata apenas de adotar tecnologias verdes, mas de
produzi-las e seus componentes, criando empregos
qualificados e diversificando a economia. O sucesso nessa "industrialização
verde" pode transformar fundamentalmente a estrutura econômica do Brasil,
aumentar sua competitividade global em um mundo em descarbonização e garantir
que os benefícios de seus vastos recursos naturais sejam capturados
internamente por meio da produção de valor agregado. Essa abordagem se alinha
com a estratégia mais ampla do Brasil de "Nova Indústria Brasil".
VIII. Conclusão
A parceria entre China e Brasil no âmbito da economia verde
é um fenômeno de crescente relevância estratégica no cenário global. Os
investimentos chineses, que já somam bilhões de reais e preveem aportes
significativos para 2025, demonstram uma clara reorientação para setores de
alto valor agregado e sustentabilidade, como energias renováveis, veículos
elétricos e infraestrutura digital. Essa mudança é impulsionada pela
convergência das ambiciosas metas de sustentabilidade da China e das vantagens
comparativas do Brasil em recursos naturais e matriz energética limpa,
configurando uma relação mutuamente benéfica que transcende o comércio
tradicional de commodities.
Os impactos para o Brasil são multifacetados, abrangendo a
geração de empregos qualificados, a modernização industrial e o avanço
tecnológico por meio da criação de centros de P&D e transferência de
conhecimento. No campo ambiental, a cooperação apoia as metas climáticas do
Brasil, incluindo a restauração de vegetação e o monitoramento do desmatamento.
Contudo, a parceria não está isenta de desafios. O risco de dependência
excessiva de capital e tecnologia chineses, a necessidade de garantir que os
benefícios econômicos se traduzam em bem-estar social equitativo e a mitigação
de potenciais impactos socioambientais negativos em projetos de grande escala
exigem atenção constante. Além disso, a "pegada de carbono importada"
de componentes fabricados em matrizes energéticas menos limpas e a complexidade
de navegar pelas tensões geopolíticas globais são considerações importantes.
Para maximizar os benefícios dessa aliança verde, o Brasil
deve adotar uma abordagem proativa e bem governada. Isso inclui a
diversificação das fontes de investimento, o fortalecimento dos marcos
regulatórios e da governança ambiental, a priorização da absorção de tecnologia
e do desenvolvimento de conteúdo local, a promoção de padrões de finanças
verdes e o engajamento contínuo em plataformas multilaterais. Ao gerenciar
cuidadosamente os riscos e capitalizar as oportunidades, o Brasil pode
consolidar sua posição como líder na economia verde global, assegurando um
desenvolvimento sustentável e inclusivo para o futuro.
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